Faz calor à tarde
Não há água no ar
Meu nariz chora sangue
E minha pele esbranquiçada descama
Mas não me queixo.
Moro no Planalto Central
Viver aqui é ser meio homem, meio calango.
Atravesso picadas no Cerrado.
E escuto a solidão dessas chapadas infinitas me gritar aos ouvidos.
A terra vermelha agarra na barra da minha calça. Mancha indelével.
Mas não me queixo.
Ipês, murunduns, caliandras e buritis enfeitam a paisagem ao meu redor
E fazem o meu caminho muito mais feliz.
Buritis, graças a Deus!
Graciliano dizia que sinalizavam os oásis do sertão...
Como bom sertanejo, sei reconhecer a milhas e milhas o perfume da terra molhada:
Perfume doce e alentador. Colo de avó.
A primeira chuva cairá como bálsamo celeste
Curando os homens, as estradas e o gado
Lavando as almas
Encherá as quaresmeiras com cigarras, as faces com sorrisos e o capim com um verde intenso
Um verde neonato, vibrante e límpido
Um verde que guarda em si a imensidão do universo.
Hoje, entretanto, a poeira ainda é farta
Cavalga rodamoinhos em volta de mim.
Mas não me queixo.
Permaneço dormente, dentro da terra
Até que o verão finalmente me convide a brotar.
Brasília/DF, 05 de Setembro de 2012.